Uma técnica que testemunhou ontem no julgamento do homicídio pela mãe de um jovem autista de Mirandela alertou que toda a sociedade falhou neste caso.
“Falhámos todos enquanto sociedade”, afirmou Celmira Macedo, especialista na área da deficiência, conhecida pelo trabalho desenvolvido no distrito de Bragança com a criação de escola de pais e a associação Leque, dedicadas a esta temática.
A técnica considerou que a sociedade falhou quando mandou para casa crianças e jovens sem uma rede de apoio, aquando do início da pandemia covid-19 e dos confinamentos com os encerramentos das respostas sociais.
O jovem de 17 anos deixou de frequentar a escola nestas circunstâncias e ficou ao cuidado da mãe, que sozinha tratava dele na aldeia de Cabanelas, no concelho de Mirandela.
A 06 de julho de 2020, o jovem, que sofria de autismo, foi resgatado morto de um poço e a mãe, de 54 anos, confessou que foi ela que o empurrou, mas foi resultado da pressão a que estava sujeita, e não premeditado.
A mãe tomava conta do jovem sozinha e partilhou com o tribunal que o filho ficou mais agressivo desde que ficou em casa, alegando que no dia da morte saiu com ele para um terreno agrícola para o tirar de casa.
Na sessão de ontem do julgamento, a mãe reiterou que saiu com o filho naquele dia para ir dar uma volta pela propriedade agrícola nas imediações da aldeia com a intenção de o distrair.
A mulher, acusada de homicídio qualificado, disse que viveu “um inferno”, desesperada, porque o filho ficou mais agressivo e nem a medicação parecia fazer efeito.
Segundo disse, noutra ocasião, chegou a chamar o 112, que colocou o jovem num colete de força, e pediu-lhes que o deixassem internado uns dias, mas no dia seguinte mandaram-no novamente para casa.
O tribunal de Mirandela tinha marcado para hoje as alegações finais do julgamento, que foram adiadas porque o Ministério Público pediu para voltar a ser ouvida, para mais esclarecimentos, a perita que fez o relatório psicológico da arguida.
O coletivo de juízes aceitou e marcou para 15 de setembro, às 10:00, nova sessão para audiência da perita e para as alegações finais.
O caso começou a ser julgado a 01 de junho no tribunal de Mirandela, com a particularidade de ter um júri.
O modelo foi solicitado pelo advogado de defesa da arguida que requereu o julgamento com a participação popular, uma solução que a lei portuguesa prevê apenas para os crimes mais graves.
Além dos três juízes que compõem o coletivo, há também quatro jurados a analisarem a prova produzida e na base da qual irão decidir em conjunto sobre a culpa e a pena a aplicar à arguida.
A mulher está em prisão preventiva desde a altura dos factos e depois de ter confessado.
Em 06 de julho de 2020, foi a própria que alertou as autoridades, que encontraram o jovem de 17 anos morto num poço, na zona de Cabanelas.